sábado, 27 de maio de 2017

Outro lado prático e otimista...A melhor forma de levar isto!!

Ainda pensando na sensibilização da doença celíaca pedi à nossa querida Rapariga do Blog ao Lado que me cedesse responder às minhas perguntas ao que ela disse logo que SIM e que, desde já, agradeço.
O objectivo é perceber como foi o seu diagnóstico, como se sentiu, como vive o dia-a-dia e como são os seus pensamentos e/ou sentimentos em relação a várias situações e/ou temas. Pois embora cá por casa se convive com a doença celíaca e se vive com a dieta sem glúten, muitas vezes eu me pergunto como será a vida dos adultos celíacos e como se organizarão na sua vida, como vivem/partilham com o parceiro e/ou a família esta diferença. 

De novo, para sensibilizar, educar e partilhar!!

Vamos lá a isto...Boa leitura e espero que vos ajude!


1) Com que idade foi diagnosticado a doença celíaca?

Olha foi por volta dos 18-19 anos. Nessa altura andava na Faculdade e associava os sintomas/reacções ao sistema nervoso desta nova etapa da minha vida.

2) Nessa altura já tinha ouvido falar na doença ou mesmo na palavra glúten?

Nada, como vês isto foi há 20 anos atrás. Se hoje se ouve falar de DC, DIG e gluten, na altura muito pouco ou nada se ouvia.

3)  Até ao diagnóstico feito, que "caminhos" percorreste? Demorou o diagnóstico?

Assim que entrei para a Faculdade, descobri sintomas anormais, mas sempre associei os sintomas de cansaço intenso ao facto de estar a viver uma nova etapa na minha vida, mais agitada, muita correria de um lado para o outro, aliado ao ginásio que decidi frequentar, só para ganhar alguma massa muscular. O cansaço era muito, mas o meu espírito persistente fazia com que todos os dias levantasse o esqueleto da cama e o levasse ate à faculdade (era mesmo isto). Não conseguia ter o rendimento que queria… a cabeça estava cansada, assim como todos os músculos do meu corpo. Os dias eram preguiçosos, contrariamente ás noites agitadas sem conseguir dormir 2 horas seguidas, sequer. De hora a hora a barriga reclamava com fome. Mas fome mesmo, chegando ao ponto de ir ao frigorífico e comer a feijoada, que havia sobrado do jantar. E sem engordar, na altura pesava 46kg. Com a barriga mais composta, tentava dormir, mas infelizmente os episódios de dores abdominais, diarreias e enjoos não me deixavam descansar. E a ansiedade aumentava, sabendo que daqui a algumas horas teria de me levantar e pôr-me a caminho. Passei uns tempos nisto, condicionada demais, na minha vida. Até que, a minha melhor amiga de sempre e para sempre, mãe, me arrastou literalmente para o médico! Estava a definhar! Embora sempre a negar, e a dizer, que não seria nada. Já na minha infância era muito magrinha, sempre fui! Talvez fosse de mim. Talvez fosse assim!! Achava normal.

Nessa altura conheci a Professora Drª Estela Monteiro, médica excepcional, que me diagnosticou DC, após análises ao sangue, biopsias e uma radiografia contrastada (hoje sei que existem métodos diferentes). Disse-me com um ar espantado, que não sabia como estava, ainda de pé! E mais espantada ficou, quando lhe referi que ainda frequentava o ginásio, ahahha! Claro, levei logo um “raspanete”! Mas como iria eu saber? O cansaço que tinha associava-o às idas ao ginásio, para ganhar alguma massa muscular (achava eu) e nunca a uma doença.

Estava explicado, o porquê de me levantar hora a hora. A minha digestão era feita em 45 minutos e portanto a “fomeca” era demasiada. Apesar do muito que comia, pouco era assimilado. As carências vitamínicas e de minerais eram notadas, assim como, o meu estado anémico grave por carência de ferro, daí o forte cansaço e dores musculares. NÃO ERA DO GINÁSIO!!



4) Quando te disseram o que tinhas, como te sentiste? Como reagiste?

Bem...depois de todos os exames feitos, numa consulta, foi-me explicada, com toda a paciência do mundo, o que era esta doença, as suas implicações e a dieta que teria de abraçar para toda a vida e lembro-me da seguinte frase que a Drª me disse: “nem a migalha que estiver em cima da mesa, você pode comer”. OK! Percebi logo que era uma coisa séria. Logo de seguida lembro-mede lhe ter feito imensas perguntas, pois era a primeira vez que estava a ouvir falar disto. Depois disso, e depois de ter saído da consulta mais mil perguntas me vieram á cabeça e lembro-me até de duvidar daquilo!Como é que, fazer uma dieta rigorosa sem glúten, sem ter de recorrer a medicação, me vai ajudar a recuperar? senti-me um pouco perdida ainda, pois não conhecia ninguém com esta doença, não havia muita informação, não havia os produtos e a variedade de produtos que há hoje...enfim! Mas por outro lado lembro-me de pensar, bem... se é só fazer uma dieta então não é mau!! Acho que até fiquei um pouco aliviada de saber que não era nada de muito grave. E até reagi bem, na verdade era ver para crer, e assim foi passei a ter uma alimentação mais cuidada retirando o glúten, por completo.


5) Depois do diagnóstico quais foram os teus primeiros passos?

A partir do dia que descobri a DC, a minha vida mudou. Passei a comer TUDO sem glúten, fiz uma lista do que podia e não podia comer, falei com os meus pais e mano, do que podia comer ou não…nessa altura ainda estávamos todos juntos. Nos alimentos que tinha duvidas, evitava, não os comia. Aliás, ainda hoje o faço.
Na altura passei a ser muito mais atenta com a alimentação e a ter cuidados, que nunca tinha tido até então:
·  Passei a ler todos os rótulos, ficava horas nas compras, mas ainda assim percebi que não seria por aí, nem todos os produtos estão identificados correctamente e surgem imensas dúvidas no início. Acho que é por ter uma ligação próxima da cozinha, que me levou, mais rápido, a conhecer todos os ingredientes que continham ou não glúten.
·  A organizar a minha dispensa de forma diferente, criando o meu cantinho sem glúten,em casa dos meus pais (nessa altura) Ainda hoje tenho um cantinho "Dos sem gluten" Apesar de não entrar gluten cá em casa!
·  A ter a minha própria torradeira. Não há cá, nem pode haver, misturas!
·  Passei a frequentar as lojas Celeiro. E também a gastar mais dinheiro, hum hum!
·  Quando viajava, não corria riscos e levava sempre comigo pão sem gluten  dentro da minha mala de viagem. Menos roupa, mais saúde, aahaha!
Comecei a pensar que não sabia fazer bolos. Todos me saiam duros, desagregados e muito“enfezados”! Quem diria que ia ter um blog de receitas sem glúten ah!! É questão de persistência. Sai mal uma, duas e três...na quarta vez sai bem. O mesmo se passou com o pão, cada vez que via o pão que tinha feito, a desmoronar ficava super desanimada, mas na semana seguinte lá ia eu tentar de novo. Hoje faço pão quase todas as semanas.

Fiz a dieta, mas é preciso paciência, persistência e aconselho a não desistir, porque os resultados e a qualidade de vida são imensos.Senti-me e sinto-me livre, apesar de acharem que estamos "presos" a uma dieta é libertador, pois quando vemos a nossa qualidade de vida aumentar depois da retirada do gluten. Quando digo retirada tem de ser por completo, nada de ter vontade de um pastel de nata e interromper a dieta para o comer, a pensar que é tão pequeno que não vai fazer mal. VAI e FAZ! Todo o processo que se tinha  feito até alí é anulado. Volta para trás. 

6) Quais foram as tuas grandes dificuldades a nível de alimentação? E em relação aos outros, como era as reações das pessoas à tua volta?

Olha as minhas limitações a nível de alimentação, no inicio, custava-me muito que comessem pizzas e bolos à minha frente. Apetecia-me comer também, mas como sabia as dificuldades por que passei pensava: Esquece!! chegas a casa e fazes. Chegava a fazer um bolo e comia metade - mesmo que não ficasse bem!
Depois era o pão, não havia muita diversidade. O que havia não me sabia bem. Refugiava-me em papas Maizena eheh. Só mais tarde descobri a marca Schar que uso até hoje.

Quanto ás reacções, é importante que as pessoas que nos são próximas entendam e percebam a nossa condição. Eu tenho a sorte de ter uma família e amigos espectaculares, que seguem à risca receitas sem glúten, compram os meus produtos quando me convidam para jantar e todos comemos juntos e igual. Seguem as regras, e quando têm duvidas, telefonam-me a perguntar, antes de lá chegar! Querem ter tudo pronto, continuo a ser uma princesa ;)!

Hoje já não moro sozinha, o meu marido é o meu apoio a 100%! Aos poucos foi experimentando as minhas receitas e dizendo que era igual, assumindo comer sem glúten, cá em casa! Hoje procura e dá sugestões de receitas sem glúten, cozinhamos juntos e sem riscos de contaminação cruzada, não existem migalhas de glúten na toalha do pequeno-almoço! Não existem utensílios diferentes, não existem tábuas de cortar pão diferentes ou 2 torradeiras.
Apoia-me em tudo e sempre. Hoje, em conversas à mesa, com outras pessoas, já é ele que prontamente responde que tem glúten e que não posso…ou que explica, e bem, esta condição, a alguém. Costumo dizer que a lição ficou bem aprendida!

Claro que há sempre reacções negativas, cheguei a ouvir: oh se comeres um bocadinho não te vai fazer assim tão mal, não morres por isso! ou dizerem que não podemos fazer tal desfeita ao aniversariante porque não aceitámos a fatia de bolo. Ou, andas metida nas dietas é por isso que és assim tão magra... Na altura não reagia, sorria só. Hoje não! Hoje assumo e aceito esta condição (para mim não é uma doença), tento sempre explicar o porquê dos meus actos, e nesse momento tento divulgar BOA e CORRECTA informação, afinal ninguém melhor que um Celiaco para divulgar a DC. Quanto mais divulgada mais informação, mais produtos e mais respeito.


7)  No teu dia-a-dia quais são agora as tuas rotinas? E com que dificuldades ainda te deparas? 

O meu dia a dia é simples e as rotinas estão muito bem aceites. Costumo dizer que se gostas de ti tens de te respeitar e o respeito que tenho pelo meu corpo é não ingerir glúten. É uma dieta que exige disciplina e organização, por exemplo, tento comer o maior nr de refeições por dia, em casa. Faço sempre, ou tento sempre, fazer pão em casa e depois congelo, assim garanto pequenos almoços e lanches “feitos por mim”. O almoço, a maioria das vezes, levo sempre de casa. E o jantar também é por casa. Se, caso contrário, por alguma eventualidade não der para levar opto sempre por um restaurante com grelha, os grelhados e salada é o meu forte.
Quando viajo tento sempre perceber, antes, se existe possibilidade de comprar no local para onde vou e se existem restaurantes certificados, o que já é mais comum ver-se fora. Ainda, assim e para prevenir levo sempre uns pacotes de pão na mala de viagem. Costumo dizer, que o espaço que vai para lá preenchido por pão, é o que dá para voltar preenchido com “recuerdos” ahhaha!


8)  Nestes últimos anos houve um  "boom" da dieta sem glúten. Como vês esta moda?

Sim de facto, oiço muita gente que opta por fazer uma dieta sem glúten. Hoje ouve-se imenso falar dessa dieta feita por pessoas que querem emagrecer. Por acaso cruzei-me em tempos com uma pessoa que seguia uma dieta sem glúten, dizia ela, para emagrecer. Ora sendo eu celíaca e conhecedora da matéria decidi ir mais longe e perguntar-lhe como era a sua dieta….no fundo percebi que a dieta passava por retirar todos os hidratos, pão, massas e farinhas de trigo…ora assim se percebe porque se emagrece. A nossa condição é bem diferente disto! Não me “chateia” que o façam e que falem, pois assim também é verdade que quanto mais se fala, ou quanto mais se procura por alguns produtos poderá ser o ponto de partida para diversificar a montra dos nossos produtos. O que me chateia é só o facto de se “entregar” a outras pessoas informação errada sobre a DC ou a DIG. Estas pessoas não têm uma condição/restrição alimentar por questões de saúde. Têm apenas necessidade de fazer uma dieta pobre em hidratos. Nós não queremos perder peso, nós queremos ter saúde e qualidade de vida, e isso conseguimos retirando o glúten. Substituindo o trigo, centeio e cevada por outras farinhas sem glúten. 

9)  Que conselho me darias como mãe de uma miúda celíaca?

Hum!! Um conselho à mãe? Que nunca use as palavras coitadinha ela não pode comer. … Acho que se deve, com todo o cuidado, claro, e depois de se explicar bem às crianças que se trata de uma doença e não de um capricho, DES-DRA-MA-TI-ZAR! Acho que devemos ser práticos, e ter soluções em cima da mesa, mesmo para que eles vejam que é possível, comer igual ao amigo com sabor. Esse é, hoje, um dos meus objetivos do blog. Mostrar que é possível, comermos sem gluten de uma forma mais saudável e bem saboroso. Mostrar que também conseguimos comer fora, mostrar que podemos ter vida social (claro com os devidos cuidados). 

10) E finalmente gostaria de agradecer continuares a dares o teu ponto de vista, sensibilizares e nos dares ideias/receitas lindas e maravilhosas no teu blogue e queria ainda perguntar como tudo começou, qual foi o teu principal objectivo e qual é o teu sentimento para com o feedback que tens na comunidade celíaca principalmente?

Sou sincera criei o blog para poder mostrar um pouco das minhas rotinas celíacas, e ter um part time, no fundo. Um entretenimento para as horas vagas, não com o objectivo que tem hoje. Hoje quero mostrar que tudo é possível, e que somos capazes de chegar lá. Houve pessoas que me contactaram a dizer qual era o meu segredo porque não conseguiam fazer um bolo, sem glúten, sequer. Hoje, fazem bolos, fazem pães, quiches e até seguiram com os seus blogues. Não é fantástico? Adoro, poder mostrar que com persistência e vontade tudo se faz. Adoro servir de inspiração. Adoro cozinhar nem que seja só para mim e poder partilhar, as receitas, a mesa, os novos produtos…. Enfim.

O blog foi crescendo e as pessoas foram pedindo mais, foram-me desafiando sem saber. E todo esse feedback que enche-me o coração. Fico mesmo feliz com o carinho que recebo. Com o “graças a si consegui” nem imaginas o que isso me faz. É tão bom fazer os outros felizes. Só posso dizer Obrigada por me lerem e me seguirem no blog/facebook.  

Claro que as respostas não me surpreenderam e mostram o lado prático e também otimista da Lipita!!

terça-feira, 16 de maio de 2017

Eu tenho duas filhas...uma é celíaca!

Cá por casa somos 4.
Quando se descobriu que a mais nova tinha a doença celíaca os restantes três fizeram as análises para fazer o devido rastreio e tudo se manteve. Cá por casa só a mais nova é celíaca.
O que me levou depois dos primeiros tempos de adaptação a questionar algumas situações que fazíamos em família, tais como: ir ao café e comer um pastel de nata ou entrar naquele shoping sem nos preocuparmos com o sítio que iríamos comer ou quando íamos à praia e passava aquele senhor a vender a bola de berlim e muitas vezes não o deixarmos escapar, principalmente a mãe ( faz me lembrar a minha infância - praia e bola de berlim).

Como faria agora em relação à minha filha mais velha, Leonor (não celíaca)? Deveria privá-la destes mimos? E a minha Sofia, como seria? Seria justo para ela estar ali connosco enquanto comemos um pastel de nata ou uma bola de berlim?

E a contaminação cá em casa, como fui gerindo? Será que comemos todos já massa sem glúten? E os bolos?

Tantas dúvidas que me invadiam e que me faziam, por vezes, perder noites de sono....

Aos poucos foi percebendo que tudo se equilibra e que a aprendizagem de comportamentos é/foi ensinada também à irmã mais velha e que aos poucos todos nos adaptamos e por isso...


  • Quando vamos a um café ... vamos beber um café e elas já sabem vão buscar uma pastilha elástica (ou um chupa), o café cá do bairro tem sempre pastilhas do Gorila!! Se, por acaso a mais velha se lembra de pedir um pastel de nata, só lhe damos se houver um mimo para a mais nova mas aos poucos a Leonor já percebeu que não é justo estar a comer um bolo quando a irmã não pode - mas, como em tudo, deve haver um equilibrio e se "naquele dia" ela quiser ocorre uma "negociação" para que ambas fiquem felizes.


  • Tudo o resto nós mudámos aos poucos...vamos menos aos shopings e/ou restaurantes mas não deixamos de ir. E se formos não se come sobremesa ou come-se uma fruta ou um gelado.
  • Na praia o "senhor da bola de berlim" lá passa por nós mas ninguém come nem falamos do assunto e a mãe tira a fruta ou a cenoura para comer e se alguém quiser algo doce o pai vai num instante buscar uns gelados da Olá ali do bar/café perto da praia.
  • Logo no ínicio decidi que só faria a partir de agora bolos ou sobremesas sem glúten - se antes não o fazia muito não fazia sentido não fazer agora sem glúten, ainda por cima tinha muito que aprender.
  • As massas - cá em casa sempre adorámos - no inicio ainda fazia um tacho com massa sem glúten e outra com as outras - mas rapidamente percebi que era arriscado (por causa da contaminação) e dava muito trabalho - aos poucos fui fazendo só massa sem glúten para todos e passado pouco tempo já todos comiam da massa sem glúten.



  • O único alimento que entra cá em casa com glúten é o pão e as únicas alturas de risco de contaminação é nos pequenos almoços ou lanches e o que faço sempre é preparar primeiro tudo o que é sem glúten e só depois preparo o outro. Tenho duas torradeiras e duas manteigas como todas as casas como a minha. A minha Leonor já sabe porque é só servida depois da irmã - por causa de haver menos risco de contaminação - e já entende muito bem. 


Aqui entre nós todos saímos a ganhar porque comemos menos doces/bolos e nos últimos anos no verão aderimos aos piqueniques que fazem sucesso na família quando vamos passear e socorremo-nos dos bolos/doces mais caseiros da mãe que a mana mais velha gosta sempre.
 (ao contrário da irmã Sofia que é mais esquisita - ainda por cima é a celíaca da família)

Se faço tudo bem? Não, de certeza que não!
 Faço o melhor que posso, uns dias melhor outros pior!
Enquanto as análises da minha Sofia continuarem negativas, continuam a validar o que faço e os sorrisos das minhas princesas também!!

Partilhem também como gerem isto tudo no vosso dia-a-dia, estou sempre aberta a ideias e partilhas!!